quarta-feira, 15 de abril de 2009

"AlfaBetAÇÃO"

AlfaBetAção
Documento, da década de 80 de discutia o novo papel que o movimento estudantil deveria cumprir. Discutia o projeto estratégico do ME, sobre a universidade e o diálogo com os movimentos sociais.
ALFABETAÇÃO
A discussão sobre o papel do Movimento Estudantil tem se resumido numa mera disputa pela UNE e demais entidades. Esta prática, não contribui para a identidade social dos estudantes. Aqui está a reflexão de três pontos básicos:
1. A relação dos estudantes com a universidade, destacando-se a forma com que os projetos dominantes absorvem as camadas médias, tendo na universidade um instrumento político-ideológico – social para tanto.
2. A relação do movimento com a sociedade, dando relevância aos principais momentos do movimento estudantil nas últimas décadas e o papel que cumpriram.
3. Como desenvolver um papel social para o Movimento Estudantil no Brasil, sem cair no vanguardismo voluntarista e, tampouco, no reivindicalismo sindical.
Muito antes de apresentar respostas prontas, pretendemos incentivar a discussão das raízes da crise atual, caracteriza pelo reivindicalismo e pelo aparelhismo reinantes. A prática democrática resulta nesta discussão e da organização política necessária para implementar as conseqüentes conclusões.
Dada a situação de dependência estrutural do capitalismo brasileiro, manifestada nos campos da ciência, da técnica e elaboração de idéias; a nova ideologia empregada passa a ter na eficiência em si o centro das preocupações, opondo-se a necessidade de gerar conhecimentos. A ideologia da tecnificação do conhecimento se impõe como a única capaz de justificar o isolamento político e social da universidade na sua relação com o conjunto da sociedade e, também, como justificativa para a suposta neutralidade do conhecimento científico, e conseqüente repressão ao posicionamento político da comunidade universitária. A partir daí, a produção e transmissão do conhecimento serão orientados por novos critérios.
Assim, grande parcela da classe média, viu florescer nos bancos universitários o “milagre econômico”, enquanto a universidade se apressava em fechar sua redoma à realidade social que ia sendo produzida. O significado da ideologia tecnicista, que resulta em supor que a técnica é neutra; que quando o Estado intervém na economia está intervindo técnica, mas não politicamente; que quando a universidade está preparando recursos humanos está preparando tecnicamente e não politicamente; ganha uma amplitude sócio-econômica e política com regime ditatorial.
A concepção de que o desenvolvimento da ciência e da tecnologia determina o desenvolvimento econômico passa a ser o discurso dos tecnocratas instalados nas universidades.
O cerceamento das liberdades políticas, a forte centralização do poder, o terror político, os expurgos e o desmantelamento do Movimento Estudantil contribuíram decisivamente para impor esta nova concepção de universidade.

A UNIVERSIDADE COMO INSTRUMENTO POLÍTICO
A universidade entendida como um lugar de luta ideológica, de enfrentamentos ideológicos, de gestação, desenvolvimento e contradição, teve seu espaço de crítica e posicionamento frente à realidade da qual ela era parte, substituído pela preocupação com o caráter eminentemente técnico, inclusive de sua própria realidade e da realidade para a qual ela era dirigida.
Na medida em que a universidade deixa de ser espaço de posicionamento e organização política da comunidade universitária, desaparece qualquer possibilidade de interferência na sociedade. A perda da função social da instituição, entendida pelo seu conteúdo e pela sua estrutura engendrada para assegurá-lo interna e externamente, são expressos mais comumente pela perda absoluta da autonomia universitária.
Porém, ao mesmo tempo em que a universidade é retirada do contexto social, de sua função política, isolando-se de forma crescente, a política do regime militar a retira, também, enquanto uma obrigação do estado. A expansão desenfreada do ensino superior é operada via privatização e mercantilização do ensino, assegurando a necessária massificação, totalmente desprovida de conteúdo político.
A transferência para o setor privado, não se dá apenas como desobrigação financeira do estado com o ensino superior. Na verdade, o ensino privado se apresenta como forma mais adequada para a formação do tipo de profissional exigido pelo modelo econômico apresentado pelo projeto neoliberal. A formação universitária deixa de ser um elemento do campo cultural e incorpora-se como elemento estratégico do desenvolvimento econômico. Nas universidades públicas, a inexistência de autonomia e o forte controle do poder passa a inibir a relação da sociedade como um todo. Nas instituições de ensino superior privado, esta relação já nasce impossibilitada.
O que precisamos reivindicar, portanto, não é um simples vínculo com o Estado, das universidades privadas, nem a simples autonomia das públicas, mas a necessidade das universidades, ou seja, um projeto de universidade que cumpra um papel de construção da sociedade global.
Isso passa por uma profunda luta ideológica que, de certa forma, antecipa as transformações estruturais, só se realizam com a conquista da hegemonia. O que segundo Gramsci, determina uma reforma das consciências e dos métodos de conhecimentos.
O PAPEL POLÍTICO DOS ESTUDANTES E SUA CONDIÇÃO SOCIAL
As contradições do ME hoje, são caracterizadas pela desvalorização profissional num mercado de trabalho escasso, onde o desemprego ou o subemprego são alternativas, devido o encarecimento da educação; pelo alijamento do poder decisório dentro da instituição, respondidas pelo projeto neoliberal.
Por outro lado, nem mesmo a esquerda tem conseguido responder a estas contradições, embora as condições vividas pelos estudantes os aproximem a cada dia da realidade dos trabalhadores. A crise ideológica do movimento estudantil é uma crise de conteúdo de classe que, em última instância, só pode ser resolvida pelo enfrentamento político.
Podemos dizer que o papel do ME situa-se mais no campo de natureza política do que no social. O ME investe no campo da grade política de forma a atingir o conjunto da sociedade. Porém, na medida em que se lança nas grandes questões da política brasileira, ao mesmo tempo estas questões não podem ser resolvidas pela via estudantil. O movimento, então é entregue ao jugo da política burguesa, na qual o reformismo passa a ganhar maior amplitude por representar uma alternativa real no campo de incorporações da classe média a esta política, via uma aliança com os partidos burgueses.
Assim o projeto reformista do ME terá uma preocupação eminentemente sindical no tocante às questões da universidade. Pois de certo modo, é permitido reivindicar no terreno sindical, desde que não se toque no terreno do poder e do conteúdo da universidade.
Quando o centro da luta dos estudantes se dava contra a ditadura militar, o economicismo se agravou. As forças reformistas do ME priorizaram um enfrentamento apenas com a política do MEC, reforçando o caráter sindical do ME. O questionamento da Reforma Universitária de 1968, limitou-se à gratuidade ou não da universidade, enquanto a discussão de conteúdo e dos interesses a que serve a universidade ficaram restritos à vanguarda classista do ME.
O ME esquiva-se da problemática da sala de aula. A denúncia do projeto neoliberal de universidade permaneceu nos pequenos círculos, propagandeando sem conseqüências mais sérias em nível de movimento. Essa incapacidade da esquerda em responder estas contradições produzidas pelo modelo tecnocrático em nível estudantil, da comunidade universitária e da sociedade, jogou no sentido de crescer o vazio político produzido pela reforma de 68.
É a partir desse conjunto de questões que podem colocar a perspectiva de polarização da massa estudantil por um projeto revolucionário para o ME, projeto esse que pressupõe um trabalho no terreno anti-capitalista. As contradições do campo puramente democrático não conseguem globalizar o movimento, ao contrário, jogam para a fragmentação, para a separação da luta reivindicatória, esquivando-se do enfrentamento ideológico.
O desenvolvimento de um pólo capaz de polarizar o conjunto da sociedade no sentido classista propiciam as condições favoráveis para a colocação desse projeto. Da mesma forma, o violento choque entre o que é produzido e transmitido na universidade e a realidade social, exige um posicionamento crítico por parte da comunidade universitária frente ao conteúdo, à formação profissional, aos currículos, etc. Isso torna a universidade um terreno fértil para um trabalho nitidamente anti-capitalista, tanto em nível político quanto ideológico.
O crescimento da universidade, sua transformação em mera formadora de mão-de-obra, produz um corte abrupto na condição social do estudante, alterando profundamente sua perspectiva profissional. É exatamente a perspectiva profissional dos estudantes que os distingue dos demais setores da comunidade universitária, dando-lhes uma identidade desde há muito perdida, quer no âmbito social, quer no próprio espaço universitário. Os pensamentos neoliberais são incapazes de dar respostas a estas contradições surgidas. O reformismo arrefece as formas de mobilização que poderiam conferir algum papel social ao ME. A esquerda ainda não consegue traduzir o enfretamento de classes no interior da universidade. A saída tem sido a ação desorganizada fora dos muros universitários, o que tende a esvaziar ainda mais o debate ideológico e a possibilidade de formação de uma nova vanguarda no ME. A massificação do movimento requer uma reorientação do seu papel, explorando as contradições advindas da nova condição social dos estudantes.
As contradições apontadas e a situação política atual do Brasil mostram que este é um terreno fértil para isto.
OS DIFERENTES PEPÉIS DO MOVIMENTO ESTUDANTIL
A história do movimento estudantil é rica em momentos nos quais ele ocupa um papel político central, polarizando o conjunto da sociedade, com formas de mobilização que influem diretamente no cenário conjuntural. Daniel Bensaid nos mostra o desafio que isto coloca para os marxistas revolucionários: “o ME tem posto a prova as organizações revolucionárias nascentes: as tem obrigado a saber adaptar-se a uma realidade política viva e complexa, a saber compreendê-la e animá-la seguindo firmemente amarrada a mola da teoria e estratégia marxista revolucionária. As organizações que passaram vigorosamente esta prova prática, primeiro terão dado um passo importante em direção a construção do partido e da internacional que necessitamos”.
O primeiro tipo de papel do ME é ocupar o vazio político dentro da sociedade. Força auxiliar ou vanguarda de substituição são os nomes mais conhecidos para esse tipo de papel. São caracterizados pela unanimidade temática e inexistência de resposta ou unificação por parte do outros movimentos sociais, principalmente dos trabalhadores. Por não possuírem um perfil de classe delimitado, restringe-se às contradições do campo democrático ou nacional, resultando em diluição do campo de contradições anti-capitalistas. É um processo essencialmente político, fruto de um descompasso das relações de força na sociedade e da vanguarda produzida no seio universitário, não apresentando relação mais direta com as contradições vividas na universidade. São momentos de profunda repressão na sociedade civil e da inexistência de um pólo político de classe que polariza a sociedade. Nestes períodos a hegemonia do movimento é das correntes reformistas, que logo vinculam as reivindicações radicalizadas do movimento com uma aliança política com os partidos burgueses, ficando, para os últimos as tarefas políticas da sociedade global e, para aqueles, as tarefas sindicais e conseqüentemente arrefecimento e controle burocrático do movimento. Desta forma, não há questões transitórias para um programa de universidade e, na comunidade universitária não é encarada enquanto cenário específico da luta de classes. Assim, sua produção e seus objetivos parecem não ter conseqüência de nível social. Por outro lado, a esquerda revolucionária não consegue articular uma alternativa de conjunto ao projeto neoliberal ficando restrita a retórica antiditatorial, contribuindo para o estreitamento do enfrentamento político e conseqüente esgotamento do movimento estudantil.
A questão de fundo, nem os reformistas nem a esquerda conseguem responder, é colocar a universidade enquanto espaço específico de construção do partido revolucionário.
O segundo tipo de papel do ME é quando este tem o efeito de detonador social, caracterizado pelo maio francês de 68. Neste caso, as formas de luta, a radicalização do questionamento do saber e o tecido social tenso detonam todo o movimento social, questionando o conjunto do sistema capitalista.
As condições necessárias para efetivar este papel é a presença de um projeto de classe implantado na universidade (o reformismo apresenta formas de luta muito diferentes das barricadas, do combate,...) e pouco implantado na sociedade, não há continuidade na acumulação de forças e a derrota se dá com a não derrubada do sistema.
Em outros casos, o movimento se transforma em partido político. No Brasil, a predominância tem sido do ME reformista. É somente a partir de 78/79 que surge um movimento operário independente e classista , capaz de atrair decisivamente, os intelectuais e o conjunto dos setores para o campo do proletariado, com uma desmarcação mais sólida. Para Michael Lowy, a reação dos intelectuais a uma contradição dada “depende não somente do grau de repulsão ao capitalismo, mas também do grau de atração que exerce o campo do proletariado”.
Assim, podemos concluir que o movimento estudantil assume papéis circunstanciais dado que a repulsa ao capitalismo exige mais que o movimento em si, do que apenas a sobrepolitização e sobreideologização no seio da universidade. Depende da descoberta do proletariado como uma força viva ou da tradição da teoria marxista no país. Estas são as causas também do marxismo revolucionário ter trazido de forma frágil e insuficiente um projeto global na universidade brasileira, pois apenas recentemente se coloca a perspectiva concreta de construção de um partido operário classista, fora dos marcos tradicionais do neoliberalismo, populismo ou reformismo.
Na medida em que a memória do movimento se perde e as organizações apresentam oscilações sem a sua construção, não há construção de um programa de transição para a universidade brasileira. A existência desse pólo classista em nível de sociedade tem um peso significativo na elaboração do papel do ME, mesmo porque as experiências do maio francês, que orientaram de certa forma, a esquerda revolucionária já se encontra distante do contexto social. Embora não se possa apontar antecipadamente o desfecho da luta de classes, nem fazer afirmações do tipo “insolvência do capitalismo”, não é possível visualizarmos hoje uma derrota em nível internacional da classe operária capaz de permitir a retomada da acumulação capitalista.
TÁTICA NA UNIVERSIDADE PARA UMA ESTRATÉGIA REVOLUCIONÁRIA
Os estudantes se distinguem dos outros setores da comunidade universitária pelo fato de serem futuros profissionais, enquanto que professores e técnicos já o são. Dois marcos referenciais se colocam para este setor enquanto movimento social: o primeiro, no âmbito da própria instituição, que o identifica enquanto integrante da comunidade universitária; o segundo, no âmbito da sociedade, identificando-se socialmente enquanto futuros assalariados. A partir destes dois campos, podemos pensar a universidade enquanto um cenário específico, onde a comunidade universitária confronta-se com a instituição, com um poder instaurado e, enquanto relação que mantém com a sociedade, o confronto se dá em termos da função social da universidade.
No campo das chamadas questões específicas – assistência estudantil, taxas, laboratórios, etc – ou de qualidade de ensino e da pesquisa, existe um potencial de massificação do movimento, precisam ser trabalhadas no sentido de questionamento do poder, de politização do movimento, podem contribuir para envolver o conjunto da comunidade universitária nas lutas até agora restritas ao setor estudantil. Devemos travar a luta política ideológica dentro da instituição.
Por isso, a importância de trabalhar a questão do poder, da democracia da universidade, dos órgãos colegiados, dos cargos diretivos, etc, indo além da mera reivindicação de eleições paritárias, provão, avaliação institucional. Estas questões são essenciais para mostrar o quadro de forças na universidade e para dar a devida dimensão da relação da instituição com o estado.
O avanço sempre que possível rumo a comissões partidárias, radicalizando o enfrentamento político com a burocracia, é a melhor forma de colocar em cheque a suposta autonomia da universidade, reivindicando o poder para os três seguimentos da comunidade universitária.
É nesse cenário que a comunidade universitária pode identificar-se politicamente, construir um programa e colocar-se em movimento, permitindo uma luta ideológica de maior qualidade. Neste sentido, é fundamental trabalhar com o conteúdo da universidade, do conhecimento, assim, o movimento pode adquirir uma natureza anti-capitalista e voltar-se concretamente para a luta dos trabalhadores e oprimidos.
A desvalorização do futuro profissional, a dicotomia entre o conhecimento e a realidade social, são respondidas segundo os interesses de classes que se combatem.
Nesta perspectiva, se coloca um papel permanente para o movimento estudantil, onde as questões da área profissional do conhecimento do acadêmico ganham conotação política e possibilitam uma relação direta com a população e com os trabalhadores; viabilizando um projeto de construção de uma universidade radicalmente comprometida com os interesses dos trabalhadores.
Este papel mais permanente do movimento estudantil, na medida em que exige a presença de um forte componente de classe junto aos estudantes e à comunidade universitária, restringe a chamada autonomia relativa do movimento estudantil. Este processo real de transformação da universidade não pode se dar sem a presença decisiva do movimento operário e popular.
O papel dos estudantes é também, levar até as últimas conseqüências o enfrentamento com o conhecimento transmitido pela instituição burguesa, há muito mais a se dizer à classe trabalhadora do que simples reivindicações de verbas e melhorias parciais em um ou outro aspecto da universidade.
Trabalhando com estas questões, os estudantes evidenciam para a sociedade a necessidade, inclusive, de outro projeto de universidade, diferente dos meros discursos em torno de uma tecnologia nacional, levantada pelos reformistas. Os estudantes pode localizar um espaço para uma prática a cerca disto, aproximando-se do movimento sindical e popular. Não é somente após a formatura que os estudantes vão colocar-se na perspectiva de trabalharem e produzirem teoricamente no campo proletário.
A contrapartida é o envolvimento do movimento operário e popular das entidades profissionais e a constatação prática da realidade social na construção de um projeto de universidade, e no conseqüente enfrentamento dentro da instituição, tornando a sala de aula um espaço e questionamento do saber transmitido.
Compreender que o conteúdo determinado não é somente voltado a prática profissional, mas também a estrutura para veicula-lo, é um ponto de partida para a reelaboração nestes termos do papel do ME, veiculando a ideologia e estrutura de poder. Separar um do outro é colaborar com os interesses burgueses. Combina-los é identificar a globalização de um projeto de universidade, tendo claro os seus limites e o papel que tem a desempenhar na luta de classes. Além disto: é dimensionar o papel permanente do movimento estudantil e os possíveis circunstanciais que venha a assumir, tanto na universidade, como na sociedade.
Na elaboração e implementação de uma tática universitária, deve-se levar em conta uma perspectiva estratégica revolucionária, sendo portanto, necessário localizar os estudantes e as demais categorias da comunidade universitária em relação ao bloco histórico estratégico. Portanto, o nosso projeto busca desenvolver um papel permanente para o movimento estudantil enquanto força componente do bloco histórico revolucionário. A realização plena desse papel está intimamente ligado a um ascenso generalizado da luta de classes.

Um comentário:

Anônimo disse...

Quanto erro de português nessa papagaiada! Os "dirigentes" é que estão precisando de aulas urgente!